Coletivo de Cidadania e Direitos Humanos

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sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Meu corpo é meu campo de batalha

Texto coletivo: Sabrina Lopes, Stéfano Belo, Mariana Zimmermann, Clarissa Oliveira, Cris Bach, Ricardo Nolasco, Semy Monastier, Guilherme Marks.


QUARTA-FEIRA DE CINZAS, 22/02, 17H, HAVERÁ GORDICE NA FONTE DXS POMBXS, LARGO DA ORDEM

Sou carne gorda latejante pululante bacante ensadecidx na lápide sacrificial. Meus braços de entidade negra que dançam ferozmente, meus seios endiabradxs gritam por umx corpx sem orgãos, farra do boi, espeto: sou chutadx e me sinto regozijadx por despertar o mais podre nelxs. Não se brinca com quem tem chifres. Eu tenho. Eu continuo avançando e sonhando com o dia em que “A violência sairá do território sacro-diabólico para servir profanamente aos ideais redentores daqueles que ganham sua voz enquanto o sangue do algoz escorre” e eu marche com a minha própria bandeira em riste, a minha própria linha xamânica, o brado do indivíduo.
Dia 29/01, dia de nhoque, dia do orgulho gordo, dia abundante e caudaloso. Eu não quero que me digam, “Sim, você é gorda, mas você é linda por dentro”. É apenas mais um jeito de me dizer que sou feia, que de jeito nenhum eu sou bonita por fora. Ser gorda não é igual a ser feia, não me venha com essa. Meu corpo sou eu. Eu quero que você veja meu corpo, conheça meu corpo. A verdadeira revolução vem não de quando a gente aprende a ignorar nossa gordura e fingir que não somos diferentes, vem de quando aprendemos a usar isto em nosso favor, quando aprendemos a desconstruir todos os mitos que propagam o ódio axs gordxs. Se fazer gordice é praticar a liberdade do gozo, e se para fazer gordice é necessário ser gordx, não me inveje: engorde.
No carnaval, todos os discursos se igualam. O meu e o de quem vai para não abrir alas, superior o ano inteiro. Sua permissão para eu sentir prazer: os olhares reprimem sobre xs gordxs quando comemos em público, mas buzinam quando atravessamos, sim, a cidade de bicicleta e nos repreendem também quando dançamos. O que mata é a dieta, não a gordura. Não obedecerei os e as repetidores e repetidoras e repetidores e repetidoras de padrão. A mensagem que estão me passando é a seguinte: “Se você engorda, é porque não consegue controlar seu desejo repugnante, e será punidx por isso com doenças horríveis e a morte.” Quem precisa de religião quando temos a patrulha antigorda para controlar nosso comportamento? Não é preciso mais ameaçar as pessoas de danação, apenas convencê-las de que nunca vão morrer ou ficar doentes se elas forem magras. (Ou se forem Falcons ou Suzies ou Barbies, com músculos de borracha ou cinturinhas esculpidas com espartilhos doentios - que importa danificar a coluna se for para sua coleira caber na sua cintura? Arrancar costelas também vale! Estranhas são as mulheres-girafas africanas, com argolas no pescoço. Do lado de cá, todxs normais...) E isso tem um poder assustador. O vômito bulímico cheira bem. A privação é aceita. Gordura, jamais.
((Também é acusado de doente todo corpo não grego, aquelx que não pode comer o que come tendo o corpo que tem. “Por que você não engorda? Por que você não come? Ah não, você vomita né? Seus joelhos são tortos.”
Sou magricela, meus joelhos são tortos, eles são roxos e eu me bato facilmente mas não largo as armas. Não largarei os sprays, não largarei as colas e as ocupações independentes do tamanho da arma que me leva para todos os lados. Continuarei a tatuá-la, a demarcá-la, a singularizá-la e a posicioná-la perante as pessoas que me discriminam. A cor do meu cabelo, o desenho na minha pele, a posição dos meus dentes. Coitadinhxs dxs que perderam o Carnaval, a verdadeira comunhão erótica que ele traz.
Me reservo e anonimamente faço minha revolução.))
A liberdade de ser o corpo e de sentir prazer sendo o corpo e de ser de fato o corpo, carregar o corpo, ter o corpo como arma.Os olhares heteronormativos sofrem nossa dança inclassificável. Somos julgadxs, mas seremos  s a l v x s  por Wilza ex-máquina. No carnaval as vozes individuais são ouvidas, florescem.
Minha carne em festa clama pelo fogo das rumbeiras, redemoinho de paixão furiosa e te arrasto enlaçadx aos meus pés. Nego o deus que não suporta excessos, mas manda ao fio da espada o filho de Abraão. Minha revolução é grande e gorda, um rolo compressor de corpo expandido. TODXS XS CORPXS SÃO PERMITIDXS. Gordx com x e com marshmallow. Gordx com caboclx e não brancx. Peçam licença às entidades de matriz africana antes de usá-las como piada. Falem em frente ax Stéfanx antes de chutar sua bunda. Encontrem motivos engraçados para rir da nossa cara. Encontrem qualquer coisa que não seja um pacote pronto para o seu conforto. Enquanto isso, no pré-carnaval de Curitiba, riremos mais que vocês, como já dançamos mais. Não é para entender nosso riso nem nossa dança. É para explodir os códigos que asseguram vossa superioridade. A beleza foi moralizada. Relaxem. Estamos em guerra.
Meu corpo é meu campo de batalha. E é nele que eu faço, eu danço, eu grito, brado a plenos pulmões. Eu faço a revolução, e ela passa pelo meu corpo e se expande pelo mundo. Meu corpo é lindo com todas as curvas, as retas, os deslizes, declives, gorduras, banhas balançando. Eu faço gordice, eu amo a gordice que sou e jogo a gordura na cara do mundo repressor. A violência é verbal, é psicológica, não só física. E eu rebato a violência. Não vou dar tapas com pétalas de margaridas. Minha luta é violenta como a violência que a sua repressão me impõe. E se mostrar meu corpo gordo é atentado ao pudor, eu vou atentar o seu pudor até seus olhos saírem das órbitas. Até, quem sabe, você consiga se libertar desse pudor, pois é ele quem propaga todo o preconceito.
Vamos executar nossa coreografia gordurosa para o deleite de seus olhos eletrônicos, mas jamais caleremos a boca em padedê anoréxico diante de suas ofensas. Somos  b a c a n t x s  e m  e s t a d o  d e  g r a ç a  em estado de violação. Todo pudor deve ser atentado. A carne exposta (abacaxis preciosxs balançam e quebram no chão), a carne cortada de quem sangra para o Carnaval continuar, quem ainda vai ameaçar tacar pedra na Geni?, temos o direito à volúpia! Temos a boca cheia de chantilly! Temos o direito à navalha da vedete ameaçada! Choramos purpurina no bronze da tirania, mas enquanto isso preparamos uma saborosa receita de bomba caseira.
Todo padrão de higiene é um padrão de exclusão, e não de limpeza. Todas as formas de opressão trabalham juntas, portanto elas devem ser combatidas juntas. Sentimos o mau cheiro e nos orgulhamos de ter os nervos fortes! Só nos trópicos poderia Dona Redonda Explodir! Somos os Monstros de Babalu, bilíngues e ventrílocos. Ocupamos as ruas como glutões, glutonas, devoramos a civilização. Tornamos tudo comestível. Dilatamos e nos misturamos, nossos corpos não têm fronteira alguma e escorrem antioxidantes.


2 comentários:

  1. Máira, só te peço pra corrigir quando puder: muita gente foi chamada no gdoc, eu nem tenho certeza de todo mundo que mexeu. Tenho certeza de que tem trechos aí, fora os meus, do Stéfano Belo, da Mariana Zimmermann, da Clarissa Oliveira, da Cris Bach, do Ricardo Nolasco, da Semy Monastier e do Guilherme Marks - fora um monte de citações. Obrigada pela força! =)

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  2. Arrumado, Sabrina! Se houver mais alguma coisa para alterar, avise.
    Essa causa também é nossa!

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